Gente, não é surpresa para ninguém que ter um perfil nas redes sociais atualmente é trivial, é básico e faz parte da identidade pessoal de cada um de nós. Verdadeiramente – em tese – tornou-se elementar para fazermos, de fato, parte da sociedade. Ou melhor, da nova sociedade. A sociedade digital.

Essa premissa, aliás, estende-se às pessoas jurídicas (startups, grandes empresas, pequenas empresas, microempreendedores etc.).

Um teste simples basta para provar esse ponto: Quando você conhece alguém, ou quer se consultar com algum profissional ou adquirir algum produto de alguma empresa, ou mesmo se tem a intenção de contratar novos funcionários, qual o primeiro lugar que você busca informações sobre essa pessoa, prestador de serviços ou empresa? Garanto que você pensou “Redes Sociais”, e sou ainda mais enfático e digo até mesmo que pensou no “Instagram”. Errei? Se errei foi por pouco, muito pouco!

Portanto, não é demais dizer que a sua imagem no “mundo virtual” vale tanto quanto sua imagem no “mundo real”, e é aqui que entra a nossa temática: os perfis falsos em redes sociais.

A discussão que gira em torno da criação de perfis falsos nas redes sociais é sobre a responsabilidade criminal daquele sujeito criador do perfil. Há crime ou é um indiferente penal?

Pois bem.

Para bem compreender a temática devemos trazer ao seu conhecimento a norma que supostamente se enquadraria ao comportamento de criar perfil falso nas redes sociais.

Art. 307, Código Penal – Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem:

Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave.

Quando você se depara com o termo “identidade”, o que você pensa? Alguns pensadores do direito penal, como o Desembargador na Seção Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Guilherme de Souza Nucci, entende que “Identidade é o conjunto de características peculiares de uma pessoa determinada, que permite reconhecê-la e individualizá-la, envolvendo o nome, a idade, o estado civil, a filiação, o sexo, entre outros dados”. Assim, a falsa identidade é evidenciada quando não é permitido que se reconheça ou identifique determinada pessoa.

Em suma, traduzindo para você na perspectiva da temática deste texto, podemos dividir em 3 pontos:

(i) quando você cria um perfil seu, mas com dados divergentes da sua própria identidade:

Vamos supor que você criou um perfil em uma rede social com a sua foto, mas com nome diverso do seu, além de apresentar dados identificadores diversos dos que lhe são próprios.

(ii) quando um terceiro cria um perfil com dados divergentes da sua própria identidade:

Vamos supor que um determinado sujeito conhecendo todas as suas características que o identifica, cria um perfil em uma rede social – é, isso mesmo, características suas, de você que está lendo esse texto – mas com a foto de uma outra pessoa.

(iii) quando você ou qualquer outra pessoa cria um perfil com um sujeito fictício:

Todos sabemos a facilidade que a tecnologia proporciona para criar personagens inexistentes, fictícios, mas com características fisionômicas extremamente reais. Neste aspecto, é possível que seja criado um perfil em uma rede social com as imagens criadas deste personagem fictício, com dados “identificadores” inventados.

Ao analisar os itens (i) e (ii) na perspectiva do crime de Falsa Identidade previsto no art. 307 do Código Penal, temos um enquadramento perfeito com relação ao atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade. Ora, quando você cria um perfil com sua foto, mas com dados identificadores totalmente divergentes dos seus, você se atribuiu uma falsa identidade. O mesmo ocorre quando é criado um perfil com a foto de uma outra pessoa, mas com os seus dados de identificação.

Agora, com relação ao item (iii) temos um olhar mais restritivo, mais cauteloso. Observe que o art. 307 do Código Penal diz atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade, se refere a alguém que existe (ou que já existiu, no caso das pessoas falecidas). O atribuir-se se refere a si próprio, alguém palpável e existente, assim como o terceiro. E o sujeito “fictício”, “inventado”, como posso criar algo falso do que é inexistente? Só se diz falso o contrário do verdadeiro, de modo que se deve presumir a existência de uma informação, coisa ou pessoa. Deve haver um parâmetro para aferir a falsidade ou veracidade de algo ou alguém. Ao nosso ver, portanto, não existe o amparo do art. 307 do Código Penal nos casos em que é criado um perfil na rede social de um ser inventado, fictício.

Contudo, ainda com relação ao item (iii), não é pelo fato de não se enquadrar, ao nosso ver, ao crime de Falsa Identidade previsto no art. 307 do Código Penal, é que o agente responsável pela criação deste perfil não será responsabilizado pelo crime que vier a praticar se se servir deste perfil de sujeito fictício. Então, por exemplo, se o agente se utilizar deste perfil para praticar golpes na internet, responderá criminalmente por estes golpes, assim como nos casos de crimes contra a honra, como calúnia, injúria e difamação, e outros tipos penais.

Vocês podem observar na leitura do art. 307 do Código Penal que não se limita aos termos atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade, essa é apenas a elementar, a primeira parte do crime. A segunda parte se refere à finalidade pretendida com a criação do perfil falso (ou da utilização da falsa identidade), qual seja “para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem”.

Aqui, temos uma questão um pouco mais delicada. Veja. Se houver a criação do perfil falso nas redes sociais (nas hipóteses dos itens (i) e (ii)), o Órgão Acusador deverá demonstrar que o sujeito tinha o dolo (isto é, a vontade e consciência) voltado para a finalidade de “obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem”. Não é necessário que o sujeito tenha atingido a finalidade almejada quando da criação do perfil falso, basta que tenha, por exemplo, atribuído a terceiro a falsa identidade e demonstrado/provado a vontade e consciência da sua finalidade.

E se não for possível provar a finalidade almejada pelo criador do perfil falso? Teremos, aqui, um indiferente penal.

Mas e se o sujeito criador do perfil falso conseguiu atingir a finalidade almejada que era de “obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem”? Neste caso, se o crime praticado for mais grave que a Falsa Identidade, responderá por aquele, sendo o delito previsto no art. 307 do Código Penal considerado apenas um meio, um caminho necessário para atingir seu propósito criminoso final.

E se o crime-fim for mais leve? O agente responderá criminalmente pelos dois.

E se a finalidade for praticar uma contravenção penal (infrações penais muito mais leves e com penas muito mais brandas)? O agente responderá, também, pelos dois.

Portanto, é inquestionável que se trata de situação extremamente tormentosa, ainda mais considerando a modernização tecnológica e as pretensões criminosas apuradas e, por isso, deve-se avaliar cada caso e todas as circunstâncias que o cerca para aferir a responsabilidade criminal do sujeito investigado.

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Vinícius Vieira

Advogado criminalista

 

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